sábado, janeiro 17, 2015

Educar sem nãos, sem limites, sem riscos, sem frustração: que futuro?


verão de 2009 - ver fotos AQUI


... Aqui a pensar na educação das crianças cada vez mais enraizada no paradigma da proteção completa e do sim_sempre sem quaisquer limites a todos os desejos, do egocentrismo absoluto prolongado eternamente, da incapacidade dos mínimos gestos de autonomia: da ida à casa de banho, higiene pessoal, mastigar comida sólida, comer sozinho, manipular objetos, falar sem problemas de dicção, apresentar um vocabulário mínimo adequado à idade, atar um sapato, vestir uma peça de roupa, respeitar o outro, conhecer limites e fronteiras, aceitar um não e tantas outras coisas que aos cinco anos deviam estar adquiridas. De ano para ano, as crianças que nos chegam ao agrupamento de escolas (pré-escolar) vêm cada vez mais assim, com a vida mastigada pelos pais, sem côdeas (se soubessem o que me irritava aquele anúncio do pão embalado sem côdeas), sem espinhas, sem pedras na calçada... Deixaram de ser a exceção. São a regra. E este estado de "muito pré" prolonga-se agora pelo primeiro ciclo e, este ano, também pelo segundo ciclo de forma muito visível. Assustador. Mais do que matemática, gasto tempo infinito a educar, a ensinar a gerir conflitos, a recuperar a autonomia, a ensinar a responsabilidade, a ajudá-los a crescer, a fazê-los acreditar que confio neles e que são capazes de muito mais. A criar neles uma motivação e um entusiasmo desaparecidos porque são incapazes de se focar numa tarefa por mais do que poucos minutos. Daqui a uns (muito poucos anos), não quero sequer imaginar o que virá por aí, sabendo que o que tenho hoje é já absolutamente surpreendente e estranho, com alterações dramáticas no percurso normal do desenvolvimento da criança. Tudo porque, parece simples, os pais (a maioria?) não confia nos pequenos seres que geraram, na sua força, na sua capacidade, no seu imenso potencial de desenvolvimento e que, por conta do medo e de um auxílio constante e tirano que as tolhe no mais essencial do seu processo de crescimento (isto NÃO é Amor), impedem os seus filhotes de, um dia mais tarde, serem pessoas felizes e completas, com entusiasmos, alegrias, tristezas, dores, e dotados da capacidade de auto controlo, capacidade de interagir com o mundo avaliando os riscos e gerir as mais básicas emoções como a frustração... 
As mesmas crianças que movem o dedinho horas a fio nos tablets que lhes colocam nas mãos para os entreter, ou se sentam horas a fio à frente de um televisor/computador (assim não dá tanto trabalho educar), são as mesmas que aos cinco e seis anos não conseguem usar uma tesoura, espalhar um bocadinho de cola num papel, usar lápis de cor, contar uma história e estão diminuídos em competências básicas, precisando cada vez mais de apoio especializado para corrigir algo que não é intrínseco, mas resultou de uma educação deficiente, pouco exigente e protetora no pior dos sentidos.  

1 comentário:

Eduardo Martinho disse...

Excelente reflexão, como sempre.
E a questão é mesmo: que futuro?
Bom fim-de-semana.
Bjokas